Caio Blinder de Nova York

	Controvertido e taciturno, Cheney tem papel central no governo Bush

Assim estaria montado o cenário para o grande embate da eleição presidencial de 2008: "Condi" versus Hillary Clinton.

De volta à realidade, o máximo que se pode oferecer é o seguinte: o processo contra Lewis Libby, ex-chefe de gabinete da vice-presidência, por perjúrio na investigação sobre o vazamento da identidade de uma agente da CIA, iluminou o papel central e controvertido do recluso e taciturno Cheney na administração Bush.

Nunca é demais lembrar que Cheney é o mais poderoso vice da história americana.

Uma das razões é que ele não tem ambições presidenciais e assim nunca ameaçou Bush.

Discrição

A atuação vital de Cheney obriga os historiadores a atualizarem os capítulos dos seus livros sobre a irrelevância do cargo, marcados por anedotas como a que costumava ser contada por Thomas Marshall, o vice de Wooddrow Wilson: era uma vez dois irmãos. Um foi para o mar, e o outro para a vice-presidência. Ambos desapareceram.

Cheney não desapareceu, mas está mais discreto do que nunca por estes dias.

Quer distância dos jornalistas para não responder a perguntas desconfortáveis sobre o escândalo do vazamento ou o que fará, caso seja convocado para depor como testemunha no julgamento de Lewis Libby.

Há até rumores sobre tensões no relacionamento de Cheney com o presidente e algumas avaliações sobre seu enfraquecimento no processo decisório.

Esta semana, por exemplo, o jornal The Washington Post revelou que figuras do alto comando do governo, inclusive Condoleezza Rice, estão desafiando os esforços de Cheney para impedir restrições nas técnicas de interrogatório de suspeitos de terrorismo.

Com sua visão sombria de mundo, Cheney foi figura-chave no endurecimento da política externa americana e é considerado o arquiteto da guerra do Iraque, mais especificamente na elaboração dos argumentos sobre uma conexão entre o regime de Saddam Hussein e a rede de terror Al-Qaeda, assim como a existência de armas de destruição em massa.

Estas justificativas para a invasão de 2003 se revelaram falsas, e o escândalo do vazamento do nome da agente da CIA reavivou com intensidade o debate sobre distorção de dados de inteligência e táticas agressivas do governo Bush para abafar as vozes dos seus críticos.

O nome da agente da CIA, Valerie Plame Wilson, teria sido identificado supostamente em represália às denúncias do seu marido, o ex-diplomata Joe Wilson, sobre manipulação de dados de inteligência.

As ramificações do escândalo de vazamento podem bater em Cheney, mas nem dá para pensar que ele irá amolecer diante do cerco.

De imediato, o vice colocou dois veteranos assistentes no lugar de Libby, ou seja, um claro recado de continuidade na política de linha dura.

Concurso de popularidade nunca foi uma preocupação de Cheney.

Para dar uma idéia, hoje em dia a taxa de aprovação do presidente está abaixo dos 40%, a pior em quase cinco anos de governo. Há um consolo: a de Cheney é a metade da de Bush.

O vice, no entanto, sempre foi uma ponte de ligação estratégica com a base mais conservadora do governo.

Só é possível imaginar Cheney fora do poder se o presidente calcular que o ônus de mantê-lo será mais pesado e insuportável do que a necessidade crucial do seu fiel escudeiro.