12 de agosto, 2005 - 23h27 GMT (20h27 Brasília)
Diego Toledo
de São Paulo
A 'blindagem' do presidente Lula, que conseguiu escapar relativamente ileso do início da crise política, começou a ruir com o depoimento do publicitário Duda Mendonça, na opinião de cientistas políticos entrevistados pela BBC Brasil.
“Daqui pra frente, o presidente estará defendendo o seu mandato. É como se ele tivesse perdido uma costela e tivesse trabalhando para recuperá-la”, afirma Bolívar Lamounier, da consultoria Augurium.
“A imagem dele está sendo comprometida, o partido dele está ruindo e a base parlamentar desmoronou porque os aliados estão se digladiando. Então, a atmosfera de desmoralização e descontentamento na sociedade é muito forte.”
Para Leôncio Martins Rodrigues, professor aposentado de ciência política da USP e da Unicamp, a possibilidade de novos escândalos e a falta de controle sobre os atores da crise política ameaçam o futuro do presidente.
“Apesar dos esforços de setores da oposição de fazer com que um Lula enfraquecido chegue ao fim do mandato, essas tentativas cada vez mais estão comprometidas”, diz Rodrigues.
Economia
Bolívar Lamounier lembra que até o depoimento de Duda Mendonça, que admitiu ter recebido dinheiro “por fora” em uma conta no exterior como pagamento pelas dívidas de campanha do PT, a crise política não chegou a afetar a estabilidade da economia brasileira.
“A economia, sem dúvida, é muito importante, mas corre em um trilho, e a crise política corre em outro trilho”, afirma o cientista político. “(Por enquanto), não estão se comunicando nem negativamente, nem positivamente.”
No entanto, novas revelações, como a entrevista do ex-deputado Valdemar Costa Neto à revista Época deste fim de semana, podem agravar ainda mais uma situação que já é complicada.
Na entrevista, o presidente do PL afirma que Lula sabia de um acordo em que o partido aceitava apoiar o PT nas eleições presidenciais de 2002 em troca do pagamento de R$ 10 milhões para campanhas do PL.
De acordo com Bolívar Lamounier, o agravamento da crise política pode romper o cerco que protege a economia da mesma maneira como abalou a ‘blindagem’ de Lula.
“Como o presidente começou a ser diretamente envolvido, é possível que isso venha a criar incertezas no mercado e o retardamento de investimentos”, diz o consultor. “Creio que haverá algum tipo de efeito na economia. Mas isso como conjectura, não é a situação de hoje.”
Popularidade e impeachment
Lamounier lembra que algumas pesquisas já mostram uma tendência de queda na popularidade do presidente, mas, na opinião dele, o índice deve cair apenas até o nível histórico de Lula e do PT – calculado pelo consultor em cerca de 25% de apoio.
O cientista político da Augurium afirma, no entanto, que o PT “está realmente desmoronando” com as revelações sobre o esquema de caixa 2 do partido. Mesmo assim, a chance de um impeachment de Lula ainda é pequena.
“Além da dificuldade da prova jurídica, existe a questão política: ninguém é imprudente de deflagrar um processo de impeachment sem que a maioria da sociedade esteja tomando partido a favor do impeachment de maneira muito clara.”
Para Bolívar Lamounier, apesar de ter passado a admitir a hipótese de impeachment, a oposição adotou um tom moderado e “não está jogando gasolina na fogueira”.
Na opinião do professor Leôncio Martins Rodrigues, além do impacto sobre a conclusão do mandato de Lula, a crise política também compromete as perspectivas de reeleição do presidente em 2006.
“A possibilidade de reeleição cada vez se torna mais estreita, não apenas em razão do declínio da popularidade de Lula entre os eleitores, mas também porque o PT como partido sairá muito debilitado desta crise”, afirma Rodrigues.
“Se esse mandato não terminar antes do tempo regulamentar, nunca na história do país um presidente que começou tão bem, chorando de felicidade, terminará chorando de tristeza”, conclui o cientista político.