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Brasil esconde instalação nuclear, diz 'Washington Post'

O governo brasileiro estaria se recusando a receber inspeções da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), o que abriria um perigoso precedente para outros países, segundo o jornal americano The Washignton Post.

No alto da primeira página, a edição deste domingo estampa a manchete "Brasil esconde instalação nuclear".

Sem dar nomes, o jornal cita fontes diplomáticas brasileiras e da agência de energia nuclear da ONU (Organização das Nações Unidas).

O diário ressalta que, segundo o governo brasileiro, as instalações em Resende (RJ) – onde fica a Fábrica de Combustível Nuclear (FCN) da estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB) – produzirão urânio enriquecido para a geração de energia elétrica e não o tipo mais puro do mineral, que pode ser usado em armas atômicas.

Entretanto, continua o Washington Post, o Brasil se recusa a receber os inspetores da agência de energia atômica da ONU no local, alegando necessidade de proteger seus segredos industriais.

Procurada pela reportagem da BBC Brasil, a assessoria de imprensa do Ministério das Relações Exteriores informou apenas que está examinando o assunto.

Há dois meses, quando a questão das inspeções chegou à imprensa, o Itamaraty também não emitiu comentários, limitando-se a dizer que o assunto tem sido objeto de negociações técnicas.

Bush

"O atrito diplomático alimenta os temores de um novo tipo de corrida nuclear, caracterizado não pela busca de armas atômicas, mas pelo desenvolvimento sigiloso e legal de uma sofisticada tecnologia para gerar energia nuclear que pode ser facilmente convertida em um programa de armas", escreve o Washington Post.
 Processo pode minar os esforços da Casa Branca para por um fim nos programas nucleares do Irã e da Coréia do Norte.
 
The Washinton Post

Para o jornal, o projeto brasileiro deixa o presidente americano, George W. Bush, em situação delicada, já que ele defende a imposição de regras mais rígidas para o enriquecimento de urânio, com o objetivo de dificultar o acesso a armas nucleares para outros países.

"Especialistas em não-proliferação de armas nucleares afirmam que, se os Estados Unidos e a ONU não tomarem uma atitude para interromper o programa brasileiro, ou pelo menos não pressionarem por mais inspeções, o processo pode minar os esforços da Casa Branca para por um fim nos programas nucleares do Irã e da Coréia do Norte."

O jornal destaca que o projeto do governo brasileiro não fere as leis internacionais, mas que as regras dizem que os inspetores da AIEA deveriam visitar o local, para garantir que a INB não será usada para fins bélicos, seja para consumo próprio, ou para comercialização.

Ainda de acordo com o jornal, nos últimos meses, a AIEA tem enviado inspetores a Resende, mas os muros altos dificultam ou impedem a visão do prédio, que ainda está em construção.

Conquista tecnológica

O jornal cita um diplomata brasileiro dizendo que "estamos muito aborrecidos e quase ofendidos, com essas suspeitas sobre o Brasil".

O Washington Post lembra que o Brasil "abdicou formalmente de programas de armas nucleares" na década de 90.

O diplomata não identificado citado pela publicação reconhece que o Brasil não permite a presença dos inspetores dentro do local, mas ressalta que os fiscais da AIEA podem inspecionar toda a área externa da FNC e analisar a qualidade do urânio que chega e que sai das instalações.

Segundo ele o Brasil "precisa proteger nossas conquistas tecnológicas".

A reportagem afirma ainda que, apesar de ainda não haver indícios de que o governo americano planeja impedir o projeto, a Casa Branca deve enviar emissários a Brasília neste mês para pressionar por mais cooperação com a agência nuclear da ONU.